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Os benefícios do kefir, sob o olhar da ciência

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out 2018

Os benefícios do kefir, sob o olhar da ciência

Sabe aquelas roupas e acessórios que fizeram tremendo sucesso em um passado longínquo e de repente ressurgem como se fossem a maior novidade? A história do kefir e de seus benefícios é mais ou menos assim.

Chamado frequentemente de “alimento do momento”, na verdade sua trajetória remonta há milhares de anos, quando povos nômades nas montanhas do Cáucaso — que marca a fronteira entre Europa e Ásia — encontraram crostas na parede dos recipientes em que transportavam leite.

“Os caucasianos diziam que os receberam do profeta Maomé, que, por sua vez, teria sido presenteado por Alá”, descreve o nutricionista Ferlando Lima Santos, coordenador de um projeto sobre o alimento na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).

Após um bom tempo, esses grãos se espalharam pela Europa e pela América do Norte, locais em que produtos à base de kefir já são comercializados em escala industrial. No Brasil, a cultura chegou há pouco tempo e ainda é caseira, mas atrai cada vez mais adeptos.

Para iniciá-la, basta encontrar quem doe os grãos — nas redes sociais há grupos dedicados a facilitar o processo — e, aí, usá-los para fermentar bebidas. A mais tradicional é o leite, que pode ser animal ou vegetal. Também dá para recorrer a uma mistura de água e açúcar mascavo.

Mas o que torna esses grãos, similares a pedacinhos de couve-flor, tão cobiçados? De acordo com o médico Dan Waitzberg, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e diretor científico da Bioma4Me, eles são formados por uma mistura específica e complexa de bactérias e leveduras que vivem em uma associação simbiótica.

Ao colocá-los dentro do leite, por exemplo, a bebida passa a ter representantes desses dois grupos de micro-organismos. É aí que está o segredo do kefir, ou seja, desse leite fermentado: ele concentra bichinhos com tendência a promover benefícios à saúde.

Por isso, há quem diga que a bebida é um alimento probiótico. Mas a nomenclatura só vale se o kefir tiver pelo menos uma bactéria classificada oficialmente como probiótica, o que nem sempre ocorre, já que a composição de micro-organismos varia entre os grãos. “Aqueles adquiridos em São Paulo são diferentes dos obtidos em Minas Gerais”, exemplifica a farmacêutica Cristina Bogsan, docente da USP.

Essa diversidade na fórmula é justamente o que não permite generalizar os achados de estudos para qualquer bebida chamada kefir. Mas a professora Elisabeth conta que, nesse momento, está trabalhando na seleção de linhagens potencialmente probióticas a partir de grãos circulantes no Brasil. Ela espera adicioná-las a culturas iniciadoras para, assim, produzir um kefir capaz de promover de fato qualquer uma das vantagens descritas pela ciência. “É um trabalho árduo, de garimpagem, mas não há outro caminho”, reflete.

Que fique claro: há muitos efeitos positivos do kefir citados pelas pesquisas. Um dos mais clássicos é o equilíbrio da microbiota intestinal. Segundo Cristina, ele é garantido pelas bactérias ácido-láticas, e não necessariamente por micro-organismos probióticos. O professor Santos relata que, ao garantir a harmonia da região, a bebida ajuda a reduzir a ocorrência de diarreia e de prisão de ventre.

Mas essa propriedade não traz benefícios apenas ao intestino. O farmacêutico Tadeu Uggere de Andrade, professor da Universidade Vila Velha (UVV), no Espírito Santo, descobriu que a modulação da microbiota é um dos fatores capazes de explicar por que, em estudo com animais, o kefir favoreceu a queda da pressão arterial — situação desejável para reduzir o risco de infarto e AVC.

Nessas experiências, o uso de kefir de leite por 60 dias levou a uma diminuição de pressão similar à induzida por remédios. Após aprofundar as análises, Andrade e um time de colegas, em colaboração com a pesquisadora Vinícia Biancardi, da Universidade Auburn, nos Estados Unidos, demonstraram que o resultado vem de uma melhoria no desequilíbrio intestinal característico da hipertensão e também do combate ao processo inflamatório do sistema nervoso central, que acaba elevando a pressão.

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